COLETIVO EMER.GENTE
10.07.2021
Associação Recreativa da Moita Redonda, Fátima
Uma iniciativa de juntar todos os que têm vontade de ver e criar, no olhar da descentralização artística.
Mostra de arte na Associação Recreativa da Moita Redonda em conjunto com outros eventos de variados meios artísticos.
Participação também do colectivo Vês.Três.
(CHILL)OPHONE
Ano:
2021
Técnica:
Acrílico, spray e pastel de óleo sobre madeira não tratada coberta de betume;
Dimensões:
1ª tábua: 185 x 20 cm, diminuindo 5 cm em altura até à 10ª tábua + telefone fixo de medidas irregulares.;
Memória descritiva da obra:
A obra “(CHILL)OPHONE” (chill-your-phone / xylophone) pretende ser um contributo para uma melhor saúde mental. É constituída por 10 tábuas de madeira, à imagem de um clássico xilofone; da tábua mais alta está suspenso um telefone fixo, com o seu cabo estendido, até bater no chão. Ao representar um xilofone, utilizo um jogo de palavras para criar uma analogia com o que proponho para tornar mais sã a vida das mentes digitalmente presas. Como?
Nesta obra, é desenhado no espaço um instrumento musical - o xilofone. Este instrumento é composto por uma sequência ordenada que faz com que seja possível a sua percussão. Dez tábuas foram pintadas em sincronia e dispostas de acordo com um ponto de fuga, fazendo com que a pintura fique descontextualizada da sua origem espacial.
Tomemos o seguinte exemplo: inserindo este objecto como a ponte para uma experiência de lazer e cultura musical, imagine-se num concerto. O que vê à volta? Um cantor, uma banda, uma orquestra.....e o público? Para onde olham...por onde olham? Muitos olharão não para a realidade à sua volta mas para um ecrã; provavelmente de telemóvel.
Ao longo do tempo, o ser humano criou e adaptou-se a novas tecnologias, fazendo delas necessidades imprescindíveis ao dia-a-dia. Mas, como em tudo na vida, há vantagens e desvantagens para uma dependência deste calibre.
Uma das desvantagens destaca-se quando passamos a viver os nossos momentos, as nossas experiências pessoais, através de um objecto - o telemóvel. A apreciação crua e presencial, as cores, o som, as pessoas...são substituídas por uma criação digital. Criamos um leitor exterior à sua biografia. Um mero espectador. Ao viver através de um ecrã, ao tentar experimentar os 5 sentidos digitalmente, perdemos a capacidade de aproveitar o real. O verdadeiro.
Nestes últimos anos fomos escravos disto mesmo. O sabor da nossa vivência está na proximidade com o outro. A última década provou que carecemos de realidade, precisamos de viver numa verdade onde se possa tocar, abraçar, beijar e amar. Sinto pelos jovens que aceitam a farsa digital. Sinto pelas vidas perdidas por desejos/ambições baseados em montagens e disfarces de baixa auto-estima. Sinto pelos que dependem de estar "on-line" e desconhecem o prazer de ler um bom livro, sentir a presença de um amigo, pasmar perante uma paisagem ou, simplesmente, prezar um concerto...
Nos últimos anos, a era virtual devorou a nossa vida tangível / terrestre; a nossa perspectiva de realidade tornou-se baseada num olhar pixelizado a cores rgb. A experiência digital tornou-se um meio para atingir um fim: a criação da nossa aparência/vida desejada, em alternativa à realidade objectiva. Mas, se esta construção parece fornecer, à primeira vista, algum grau de satisfação, por outro lado ( um lado menos "democrático", menos prudente ), permite o controlo e apoderação da nossa insegura privacidade por entidades terceiras.
Tal e qual como as placas do xilofone, precisamos de outros, iguais a nós, perto de nós, que nos façam ter um propósito, que façam com que este mundo instável e imprevisível faça sentido - faça música. Se virmos a vida como as baquetas, vibramos até os batimentos acabarem. O meu desejo é conseguirmos viver mais "off-line" voltando a conseguir ver e apreciar momentos ao vivo - com ritmo!
Quero ser este telefone fixo - desconectado.
Portanto: chill-your-phone!
Ana Malta | NUMPÁRA, Junho 2021